O primeiro Bispo do Aterrado
Ao ser confirmada a criação da Diocese do Aterrado, Padre Parreiras arregaçou a batina e se empenhou na construção da residência para o Bispo a ser nomeado. Era questão de tempo para se conhecer o nome do futuro ocupante do Palácio da Assumpção. As apostas para o futuro bispo da diocese giravam em torno do nome de Padre Parreiras, porque graças ao seu empenho, apoio das autoridades e dos habitantes do arraial é que foi possível a concretização desse sonho. A diocese do Aterrado no sertão mineiro, como se dizia na época, longe da civilização, implicaria na escolha de um padre jovem, dinâmico que aceitasse o desafio de levar o Evangelho aos diferentes rincões da região. Dom Silvério e Dom Joaquim, bispos de Mariana e Diamantina, levaram em consideração a idade e saúde de Padre Parreiras que à época estava com aproximadamente 60 anos e indicaram Padre Manoel Nunes pelo seu dinamismo e juventude ao Vaticano para ser nomeado bispo do Aterrado. As palavras de Cristo a Pedro “Tu es Petrus et super hanc petram aedificabo Ecclesiam meam” pode ser aplicada a Padre Manoel que com apenas 36 anos de idade, aceitou a missão de “Edificar a Igreja sobre uma pedra, que é o próprio Cristo, na Diocese de Luz.”.
A posse de Dom Manoel
Após um ano de sua nomeação, finalmente chegou ao Arraial o primeiro bispo da Diocese do Aterrado acompanhado de Dom Silvério Gomes. Padre Parreiras junto às autoridades, padres, Conferência dos Vicentinos e o Apostolado da Oração estavam à sua espera no Morro do Jorge. Bandeirolas e arcos de boas vindas enfeitavam a estrada que ligava Esteios até a Catedral (atual santuário) com a presença da população e da Banda Lyra Vicentina Aterradense que dava os seus primeiros passos. Por suas oratórias, tanto cívica como religiosa, Josaphat Macedo, ainda estudante de medicina, foi escolhido para ser o orador oficial na recepção a Dom Manoel. Josaphat Macedo fez alusão ao lema do jovem Bispo “Fragilitati Nostrae Praesidium”, mostrando a confiança de Dom Manoel em pedir a Nossa Senhora para ser a “Proteção de Nossa Fraqueza”. Ao convidar Capitão Dú para fazer a entrega simbólica das chaves do Arraial a Dom Manoel, Josaphat repetiu as palavras de Josué (14,15) “Ego autem et domus mea serviemus Domino”, expressando o pensamento de todo o povo católico da Diocese: “Eu e minha casa serviremos ao Senhor” em obediência ao bispo, ora empossado. Padre Nicolau Del Luca, decano da diocese de Mariana, em nome dos Padres da nova Diocese assim se expressou: “muitos escandalizados e descrentes não acreditavam na capacidade de Padre Parreiras em transformar o Aterrado em Sede Episcopal”. Continuou ele: “Veni et vide” “Venham para ver com os próprios olhos”, o pequeno e humilde Aterrado sobrepujou-se às demais cidades vizinhas e tornou-se a Metrópole da Diocese. Agradecendo a recepção, Dom Manoel colocou-se à disposição para ajudar a Diocese do Aterrado a crescer em bens materiais e espirituais como em Filipenses (4,13) dizendo: “Omnia possum in eo qui me confortat”, isto é, “Tudo posso naquele que me fortalece” como a dizer “O Senhor me ajudará a conduzir este rebanho”. Com a celebração da Santa Missa por Dom Manoel, Dom Silvério, Padre Parreiras e outros padres presentes, as festividades de posse se encerraram e em procissão os fiéis conduziram o senhor bispo até o Palácio Episcopal. Começava a missão e os desafios para Dom Manoel que era auxiliado por sua irmã Consuelo Nunes Coelho, conhecida por Dona Bembém. Alguns anos depois os sobrinhos Omar Nunes, José Atanásio, Hortência e Conceição vieram morar no Palácio Episcopal.
Padre Parreiras volta para Mariana
Após a posse e passado alguns dias, muitos boatos rondaram o Palácio da Assumpção, como a transferência da sede, visto que o Arraial do Aterrado era tão desconhecido que o Diário Oficial do Estado de Minas publicara a nomeação de Dom Manoel para o Aterrado na Bahia. Desfeito o boato e consultando a Bula Papal consta a Diocese do Aterrado composta das seguintes localidades (grafia reproduzida com o original): Aterrado, Abaede, Arcos, Dores de Judaya, Piumehy, Pimenta, Perobas, S. Joao da Gloria, S. Roque, Bambuhy, S. Gothardo, Tiros, Morada Nova, Porto Real, Arcado, S. Nimo e S, Francisco (obs. Grafia em latim). Para nomear um Vigário Geral alguns padres foram convidados e não aceitaram a missão. Padre Parreiras, por sua humildade e santidade, aceitou o cargo de Vigário Geral em obediência ao senhor Bispo. Em visitas pastorais nas paróquias da diocese, Padre Parreiras escutava o comentário de que ele estava fazendo o papel de “Vigário Geral tapa buraco”, até que fosse nomeado outro para o seu lugar. Sentindo-se humilhado, em carta a Dom Silvério, Parreiras pediu o seu retorno para a Diocese de Mariana. Dom Manoel pagou “caro” pela brincadeira, pois segundo comentários no Aterrado Parreiras havia sido expulso da diocese. Soube-se mais tarde que Dom Silvério, em acordo com Dom Manoel, pediu a sua volta para Mariana onde iria prestar serviços em paróquias e Santas Casas, o que ocorreu por mais de vinte anos. Em sua última missa na catedral Padre Parreiras teve a seguinte premonição: “O Aterrado ainda há de acabar com as lobeiras e formigueiros e irá se transformar na Princesa do Oeste.” Pelos serviços prestados às dioceses de Mariana e do Aterrado, foi elevado a Monsenhor Joaquim das Neves Parreiras. Faleceu aos 80 anos em Ouro Preto, em 1941 e seus restos mortais retornaram a Luz em 1952, tendo sido sepultado na Igreja que ele havia construído, o Santuário de Nossa Senhora de Fátima. Monsenhor Parreiras foi ”Sacerdos Magnus Qui in diebus sui Placuit Deo”, Sacerdote que em todos os dias de sua vida agradou a Deus.
Os primeiros desafios de Dom Manoel
Quando chegou ao Aterrado, Dom Manoel se viu diante de um grande desafio: transformar o Arraial num grande município. Uma corrida contra o tempo se fazia necessária. O Aterrado necessitava de um impulso que só os grandes homens e a boa vontade das lideranças podiam conseguir. A nomeação de um Vigário Geral e a criação de um Conselho Diocesano foram os primeiros passos para se dotar o arraial de uma estrutura ainda que pequena. Para Vigário Geral, nomeou Cônego Vicente de Mendonça que trabalhava em Abaeté e convocou as lideranças locais, presididas por Capitão Dú e Antônio Guimarães de Macedo, para formar o seu Conselho Diretor. Para a comunicação com os padres montou uma tipografia e fundou o jornal Luz do Aterrado para ser o “Órgão Cathólico da Diocese do Aterrado” em 1922, cujo diretor era Cônego Vicente de Mendonça e funcionava junto ao Palácio. A falta de energia elétrica era um problema a ser enfrentado. Acostumado aos grandes desafios Dom Manoel procurou Dr. Pedro Cardoso (Dr. Peri) e Antônio Guimarães de Macedo e propôs procurar um local para que fosse erigida uma barragem que pudesse fornecer energia para o arraial. A construção da barragem e a vinda de energia elétrica iriam contrariar os comerciantes de querosene, de azeite e os vendedores de lamparinas que diziam: “Este bispo vai arruinar os nossos negócios. Quem vai comprar querosene, azeite e lamparina?” Alguns versos foram criados descrevendo a importância do lampião: ”Senhores do Aterrado/ Eis um negócio da China/ Dou meu cavallo arreiado/ Por um lampeão da esquina”. (Publicado no jornal Luz do Aterrado em 1923) Em 24 de dezembro de 1922, solenidade do |Natal a energia elétrica foi acesa pela primeira vez no Aterrado. A Catedral (atual Santuário) foi todo iluminado como se fosse dia. No sermão, Dom Manoel usou as palavras do Profeta Isaias “O povo que andava nas trevas viu uma grande luz” para falar da importância da energia elétrica.